Atendimento psicológico online no Brasil: de 2000 a 2014

 Online therapy psychological care in Brazil: from 2000 to 2014.

Giselle Dechen

Psicóloga Cognitivo-Comportamental em Florianópolis
Terapia Online e Presencial
Especialista em ansiedade

 Atendimento psicológico online no Brasil: de 2000 a 2014

Giselle Dechen Carvalho 1 , Vera Baumgarten Ulysséa Baião 2 

1Aluna de pós-graduação do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva – Florianópolis SC

2Doutora em Psicologia Experimental – Universidade de São Paulo (USP)

RESUMO

O atendimento psicológico online foi autorizado em caráter de pesquisa desde o ano 2000 (Resolução CFP 003/2000), regulamentado em 2005 (Resolução 012/2005) e com novas regras em 2012 (Resolução 011/2012). Esta modalidade de atendimento pode ser realizada de forma assíncrona (e-mail) e síncrona (chat e videoconferência). Esta forma tecnológica de atender vem acompanhada de um grande alcance geográfico e acessibilidade a públicos diversos, como pacientes que residem fora de seu país ou que não querem ou não conseguem frequentar sessões presenciais de terapia, seja pela barreira da língua, motivos de saúde ou outros. Nas publicações foram encontradas reflexões acerca do vínculo terapêutico, segurança da internet e conexão, tempo de terapia, acessibilidade, perfil de pacientes. A proposta presente consistiu em sistematizar informações sobre esta temática, seu histórico, suas características e particularidades. O presente estudo foi uma revisão bibliográfica de publicações científicas brasileiras, datadas de 2000 até 2014, sobre atendimento psicológico online. A busca ocorreu em http://www.bvs-psi.org.br e foram encontradas publicações nas revistas eletrônicas: Psicologia, Ciência e Profissão; Psicologia em estudo; Temas em Psicologia; Revista Brasileira de Orientação Profissional; Revista Mental; Revista da SPAGESP; e teses da Universidade de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de Campinas e Universidade de Brasília. Foram encontrados os seguintes materiais: 3 teses, sendo 2 de Mestrado e 1 de Doutorado, e 9 artigos. As temáticas das publicações se subdividem em: modalidades de intervenção psicológica online (2 artigos), relação terapêutica em intervenção psicológica online (2 teses e 1 artigo), internet e intervenções psicológicas online (3 artigos), orientação profissional online (1 artigo), intervenção psicológica online em grupo (1 tese e 1 artigo), e por fim, psicoterapia online (1 artigo). Nos anos 2000, 2001, 2004, 2008, 2009 e 2010 não foram encontradas publicações sobre atendimento psicológico online. Em 2002 tiveram 2 publicações, em 2003 apenas 1; em 2005, 2006 e 2007 tiveram 1 publicação em cada ano, assim como em 2011 e 2012. Em 2013 e 2014 este número dobra e foram encontradas 2 publicações em cada ano. Percebeu-se que na literatura nacional as publicações sobre atendimento psicológico online ainda são bem escassas, sendo encontrados apenas 12 trabalhos nesta temática no período estabelecido. A relação entre internet e Psicologia tem muito ainda a ser explorada, mais especificamente no que diz respeito a formas de atuação do psicólogo, temáticas a serem trabalhadas com pacientes, relação terapêutica, dentre muitos outros desafios que o presente traz e que o futuro reserva. É uma prática que vem crescendo e estudos ressaltam que este campo é promissor e benéfico à saúde mental, uma modalidade legítima de intervenção psicológica.                                                                                                                                                              

Palavras-chave: atendimento online, terapia online, internet, computador. 

INTRODUÇÃO

“… é grande a quantidade de serviços de finalidade terapêutica ofertados na Web. Queiramos ou não incorporá-los à nossa prática profissional, não cabe mais ignorarmos o assunto nem refutarmos essa realidade com base em concepções adquiridas em outro contexto. ” (Donnamaria, 2013)

As novas tecnologias já fazem parte da sociedade e da cultura de um modo bem arraigado, sendo responsáveis por boa parte da mediação da interação entre as pessoas, e já são consideradas indispensáveis para a informação e comunicação (Scorsolini-Comin, F., 2013).   

As tecnologias digitais se fazem presentes na constituição de novos conhecimentos e informações, são parte dos processos de produção em vários campos. A aprendizagem pode acontecer também, como aponta Kenski (apud Giebelen e G. de Góes Brennand, 2014): 

“Através de imagens, sons e movimentos apresentados virtualmente em filmes, vídeos e demais equipamentos eletrônicos de comunicação, é possível a fixação de imagens, o armazenamento de vivências, sentimentos, aprendizagens e lembranças que não necessariamente foram vivenciadas in loco pelos seus espectadores. ”

A internet se apresenta como um novo espaço para realizações e interações consideradas reais, pois para se criar um vínculo de importância, os encontros não precisam necessariamente ser presenciais (Donnamaria, C.P. e Terzis, A., 2012). 

Miranda e Araujo (2012) sugerem que há uma crescente utilização de tecnologias de informação e comunicação (TICs) na área da saúde. A internet permite trocas rápidas de informações, orientações e serviços entre profissionais e pacientes. 

“ E-saúde comporta diversas potencialidades: empoderamento dos pacientes; evolução dos serviços de saúde; educação de pacientes e profissionais; extensão do acesso à informação e aos serviços de saúde; e maior eficiência do processo de promover saúde, prevenir e curar doenças. ” (Miranda e Araujo, 2012)

Este trabalho traz reflexões, análises, pesquisas sobre a união da Psicologia e internet no âmbito clínico, mais especificamente sobre atendimento psicológico online. As normas do Conselho Federal de Psicologia para esta prática também são abordadas em suas três resoluções, dos anos de 2000, 2005 e a que está em vigor, de 2012.

Esta nova modalidade de atender pacientes vem permitindo um grande alcance geográfico e acessibilidade a públicos diversos, como pacientes que residem fora de seu país ou que não querem ou não conseguem frequentar sessões presenciais de terapia, seja pela barreira da língua, motivos de saúde ou outros. Nas doze publicações encontradas, tem-se dados e reflexões acerca do vínculo terapêutico, segurança da internet e conexão, tempo de terapia, acessibilidade, perfil de pacientes.

MÉTODO, JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS      

Para o presente trabalho foi realizada uma busca em publicações de revistas científicas eletrônicas nacionais, datadas de 2000 a 2014, sobre atendimento psicológico online. 

A busca bibliográfica ocorreu em http://www.bvs-psi.org.br e foram encontradas publicações nas revistas eletrônicas: Psicologia, Ciência e Profissão; Psicologia em estudo; Temas em Psicologia; Revista Brasileira de Orientação Profissional; Revista Mental; Revista da SPAGESP; e teses da Universidade de São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de Campinas e Universidade de Brasília. Foram encontrados os seguintes materiais: 3 teses, sendo 2 de Mestrado e 1 de Doutorado, e 9 artigos.

A proposta presente é de levantar o histórico de reflexões e práticas mediadas por computador por psicólogos no Brasil no período determinado. Com o aumento do uso de tecnologias faz-se necessário que a Psicologia acompanhe esta demanda e que seja possível o conhecimento e solidificação desta prática no nosso país, assim como conhecendo obstáculos para no futuro superá-los. 

HISTÓRICO DO ATENDIMENTO PSICOLÓGICO MEDIADO POR COMPUTADOR NO BRASIL 

Em setembro de 2000 surge no Brasil a primeira resolução do Conselho Federal de Psicologia sobre atendimento psicológico mediado por computador. A Resolução CFP Nº 003/2000 regulamenta o atendimento psicoterapêutico online em caráter experimental, por ainda não se conhecer os efeitos desta prática e nem ter ainda métodos especificados para esta modalidade. Por ser concebido como pesquisa, precisava seguir os passos para tal: ter um projeto, ser aprovado pelo Comitê de Ética, seguir todas as normas éticas de atuação profissional, entre outras.

Ainda nesta resolução diferenciava-se a prática psicoterapêutica (que não poderia ter cobrança de honorários) da orientação psicológica online e outras práticas pontuais e informativas. Através de um cadastro de site do profissional psicólogo pelo Conselho Federal de Psicologia, gratuito, gerando um selo de credenciamento (hiperlink), era possível se exercer a Psicologia de forma online, tanto de forma assíncrona (e-mails) como síncrona (chats e videoconferência). Para se fazer pesquisa em psicoterapia online também era necessário ter um site profissional cadastrado com o selo de credenciamento. Como forma de atuação profissional não psicoterapêutica concebia-se algumas práticas como: orientação psicológica e afetivo-sexual; orientação profissional; orientação de aprendizagem e Psicologia escolar; orientação ergonômica; consultorias a empresas; reabilitação cognitiva, ideomotora e comunicativa; processos prévios de seleção de pessoal; testes informatizados validados e utilização de softwares informatizados e educativos. Estes serviços podiam ser remunerados.

Após cinco anos tem-se a Resolução CFP N° 012/2005, que mantém as diretrizes para pesquisa em atendimento psicoterapêutico, reforçando que a solicitação de cadastramento de sites, tanto para pesquisa como para outros serviços psicológicos, deveriam acontecer via site do Conselho Federal de Psicologia www.cfp.org.br/selo.

Enfim chega a terceira Resolução que vigora até os dias atuais, a Resolução CFP N° 011/ 2012 que traz algumas complementariedades e esclarecimentos importantes. A descrição dos serviços permitidos muda um pouco: orientações psicológicas diversas em até 20 encontros (síncronos ou assíncronos); processos prévios de seleção de pessoal; aplicação de testes regulamentados; supervisão da atuação de psicólogos, eventual ou que complemente a formação presencial; atendimento eventual de pacientes que estão em trânsito e/ou se encontrem impossibilitados de comparecer a um atendimento presencial. Em consideração à segurança da internet, deve-se esclarecer ao cliente esta temática e o sigilo, alertando-o, especificando quais serão os recursos tecnológicos utilizados. Para atendimento de clientes menores de idade deve-se considerar critérios do Estatuto da Criança e do Adolescente, Código de Ética e dispositivos legais adequados. 

Para o site cadastrado tem-se algumas regras como: apresentar nome e número do registro profissional; informação sobre o número de sessões permitidas; conter links para o Código de Ética profissional, para a Resolução vigente, para o site do CRP e para o site do CFP, não podendo conter links para outros sites que não sejam estes. O selo de credenciamento tem validade de três anos, podendo ser renovado. A Resolução em questão traz um anexo chamado “Manual sobre o cadastramento de sites”, explicando passo a passo como funciona e os prazos para as solicitações.

Em 2002, Oliver Zancul Prado disse em sua dissertação de mestrado para USP que a revolução tecnológica veio trazendo instrumentos e apoio à prática do psicólogo, pois muitos sentiram necessidade de usar a internet para oferecer seus serviços. Após pesquisa em práticas fora do Brasil de atendimento psicológico online síncrono e assíncrono, Prado traz uma listagem de vantagens e desvantagens desta prática. Concluiu-se que algumas vantagens importantes seriam: levar acesso da Psicologia a localidades que não dispõem deste serviço, menor custo para o cliente, maior flexibilidade de horário, menor preocupação do cliente em ser julgado ou ser vítima de preconceito por frequentar o consultório, possibilidade de o cliente enviar uma mensagem/e-mail ao terapeuta no momento em que necessita de ajuda. Como desfavoráveis encontrou-se também alguns itens como: dificuldade na identificação do cliente e na verificação do credenciamento profissional, desconhecimento por parte do terapeuta da cultura/acontecimentos locais do cliente, dificuldade em se avaliar e diagnosticar à distância, conexão e segurança da internet, problemas de comunicação devido a erros de interpretação da escrita. Lembrando que nesta época esta prática era realizada apenas por meio escrito (chats ou e-mails).

Estudar a relação terapêutica no atendimento psicológico mediado por computador foi o objetivo deste estudo, utilizando-se o WAI (Working Alliance Inventory). Nesta proposta pretendeu-se verificar a viabilidade de atender clientes em psicoterapia breve (15 semanas) na forma de contatos assíncronos a partir de postagens semanais numa página da internet criada para este fim (fórum de discussão).

Em seus estudos foi concluído que é possível desenvolver um vínculo satisfatório, colaborativo e com comprometimento entre clientes e terapeutas por intermédio da internet. Em 2006, Prado publica um artigo com o relato desta pesquisa na revista Psicologia em Estudo.

Ainda neste ano, 2002, Elza Rocha Pinto publica um artigo na revista Temas em Psicologia da SBP, sobre as modalidades de atendimento psicológico online. Em seu trabalho foi constatado que haviam páginas informativas e de orientação aqui no Brasil, que tratavam sobre orientação vocacional, psicopatologia psicanalítica, entre outras temáticas. Ela relata em artigo sua experiência com um site que criou alguns anos antes (1995), chamado “Página Psi” sobre Psicologia e Psicanálise, com textos informativos e possibilidade de interação com leitores através de e-mails/formulários com solicitação de ajuda psicológica. Percebeu-se uma crescente demanda pela procura de apoio psicológico e surgiram os atendimentos virtuais (utilizando a escrita). 

“O novo mundo virtual, cheio de tantas promessas estranhas e maravilhosas, dependia de um conhecimento prévio sobre a máquina e seus mecanismos, que inicialmente se mostravam bastante complexos. ” (Pinto, 2002)

A barreira tecnológica encontrada foi grande e com ela vieram reflexões acerca da preservação do sigilo e segurança das informações trocadas online. A preocupação em relação aos erros de interpretação e análise da escrita dos clientes veio em debate, questões como a possibilidade de expressar emoções através da palavra, por exemplo. 

Em conclusão a autora propõe que os atendimentos online são fundamentais para pacientes que apresentam certo tipo de dificuldade que os impediria de comparecer ao atendimento presencial.

Na revista Psicologia: Ciência e Profissão em 2003, mais reflexões surgem com o artigo de Leonardo Pinto de Almeida, sobre Psicologia e internet. Ele traz conceitos sobre a internet como liberdades diversas, regras não claras, fluidez, “imediatez”. Concebe a terapia online como secundária a presencial, por falta de estudos ainda, mas segue afirmando que qualquer contato entre terapeuta e cliente é caracterizado como terapêutico. Este encontro psicoterapêutico é um espaço de transformação em que se constrói colaborativamente. Deixa aberta a discussão pois acredita que “do contrário, nós nos colocaremos em uma camisa de força, acreditando que chegamos a um modelo perfeito e, por isso, imutável. ”

Em 2005 encontra-se uma publicação de artigo na Revista Brasileira de Orientação Profissional relatando um Programa de Orientação Profissional online, de autoria de Maria Elci Spaccaquerche. Este programa já existia presencialmente e foi adaptado ao universo virtual que se concebeu como usando linguagem coloquial, apresentando mais objetividade na escrita e utilização de imagens atrativas. O orientando se cadastrava no site e recebia login e senha para ter acesso aos textos, fóruns e salas de bate-papo, e também poderia enviar mensagens privadas ao orientador ao final do programa. Este trabalho era composto por etapas e cada uma apresentada um prazo para conclusão, estendendo-se a cinco semanas no total.  A conclusão que a autora deste estudo chegou foi a viabilidade de se realizar Orientação Profissional via internet e com resultados satisfatórios, com a peculiaridade do dinamismo e rapidez que este meio traz.

Para relatar um trabalho que acontecia no Núcleo de Pesquisas em Psicologia e Informática (NPPI) da PUC SP, foi publicado um artigo em 2007 por Ivelise Fortim, Leonardo Antonio e Marui Cosentino, na revista Psicologia: Ciência e Profissão. Este serviço que inicialmente era informativo e de atendimento à população presencialmente, passou aos poucos a ter sua dimensão online. A página que era em 1995 apenas informativa, começou mais adiante a receber e-mails de usuários anônimos buscando aconselhamento psicológico. Esta demanda inicialmente era encaminhada para o serviço de atendimento presencial ou para profissionais de sua localidade. “A primeira constatação foi o alto grau de sofrimento psíquico presente na maior parte dos relatos enviados, e por essa razão, o pedido de ajuda via e-mail revelou-se um novo meio pelo qual as pessoas poderiam expressar suas angústias. ” A partir de 2000, o Núcleo começou a desenvolver o serviço de aconselhamento via e-mail de maneira formal. A maior procura por conselhos era da ordem de relacionamentos amorosos e familiares, autoestima, tristeza, sexualidade, entre outros. Concluiu-se que a internet possibilitava uma certa liberdade de expressão baseada também no anonimato dos usuários, a rapidez e objetividade com que se podia responder parecia atrativo. O aumento da popularização e acesso à internet propiciavam o aumento da demanda por este serviço, que transcendia também obstáculos como custos, localidade, horários, enfim, limites que a clínica presencial apresenta. 

Antonios Terzis e Carla Pontes Donnamaria publicam seu trabalho em 2011 na Revista da SPAGESP, e sob a perspectiva da Psicanálise, fizeram algumas análises do atendimento psicológico online. Neste artigo surge a possibilidade de interação paciente-terapeuta por videoconferência, que há alguns anos atrás não se encontrava disponível. A reflexão é feita a partir da tese de doutorado da autora (em andamento no momento) sobre grupos online, partindo-se do ponto de que o grupo mediado pela internet seria benéfico assim como no presencial, devido ao compartilhamento de experiências de pessoas num mesmo tempo e espaço. Com o intermédio de um computador para desenvolver esta relação paciente-terapeuta concluiu-se que a limitação de expressões não verbais pode aprimorar a fala, de ambos os lados, para se fazerem compreender. Questões como domínio da tecnologia utilizada e cuidados éticos com a segurança e sigilo devem ser sempre a base desta atuação. Este trabalho é mais detalhado em 2013, com a conclusão da tese de doutorado da autora.

Em 2012, estes mesmos autores publicam um estudo sobre relações humanas mediadas por computador, na Revista Mental. Apontam algumas vantagens de mecanismos online para a desinibição das interações humanas como anonimato, assincronicidade e não ter a presença física de uma autoridade, como o terapeuta, neste caso.  A internet pode ser utilizada como um meio de iniciar uma empreitada, um primeiro passo, e pode ser concebida como uma forma de aproximar pessoas.

Gomide, Martins e Ronzani (2013) em publicação na Revista Psicologia em Estudo fazem referências a práticas de intervenções comportamentais computadorizadas, que teriam como foco a mudança de comportamento e alivio de sintomas de pacientes com transtornos mentais. Estas práticas poderiam ser utilizadas quando paciente não tem recursos para procurar serviço presencial, para os que enfrentam fila de espera, como complemento de tratamento padrão, para prevenção de recaídas, para superar obstáculos geográficos, evitar estigmas em relação ao tratamento, e, usado para prevenção. Neste estudo pretendeu-se analisar a viabilidade desta modalidade trazendo evidências de sua eficácia em outros países. Conclui-se que com o significativo aumento do acesso às tecnologias no Brasil, deve haver uma aproximação cada vez maior entre a área da saúde e das tecnologias da informação, e, que a intervenção comportamental mediada por computador deve se seguir como uma alternativa para melhorias na saúde. 

Ainda em 2013, Carla Pontes Donnamaria conclui sua tese de doutorado pela PUC Campinas, explorando questões sobre atendimento psicológico grupal via internet. Ela faz uma retrospectiva de serviços psicológicos mediados por computador no Brasil, como já descrito em parágrafos anteriores. Seu estudo nos traz algumas reflexões sobre evidências da contraindicação de atendimento psicológico online para casos graves, como abuso sexual e violência, pacientes com potencial suicida, pacientes que distorcem a realidade… mas em contrapartida encontra estudos que evidenciam o sucesso desta prática para estes casos. Sobre a prática do psicólogo, é fundamental que se conheça e que se aja dentro da lei e dos princípios éticos de acordo com o Conselho Federal de Psicologia, incluindo um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido sobre confiabilidade e privacidade dentro de um universo tão vulnerável que é a internet. Questões técnicas sobre o uso da tecnologia devem ser dominadas por paciente e terapeuta, e este deve ter cadastro do paciente com dados para contatos de emergência, assim como no atendimento presencial. O trabalho consistiu em descrever experiências de atendimento psicológico à distância com grupos, através de videoconferência, sob a perspectiva da Psicanálise. A pesquisa foi qualitativa, realizada com onze mulheres de idades entre 23 e 47 anos, brasileiras residentes no país e fora também, subdivididas em dois grupos. Os encontros eram feitos com a terapeuta e cada participante na sua localidade, com a imagem de todas aparecendo em tempo real. A autora concluiu, dentre outras coisas, que a prática com grupos online é bastante similar a presencial, considerando características como boa adesão à terapia, envolvimento com as vivências e motivação.  O que encontrou de diferente do trabalho presencial foram o setting ser corresponsabilidade de todas do grupo e não só da terapeuta, como preparação do ambiente físico e do instrumento tecnológico, sendo que este apresenta certas vulnerabilidades, como interrupção da comunicação durante o processo, por exemplo. Os grupos online têm grande potencial terapêutico pois é também um espaço de aceitação e escuta.

Carmelita Gomes Rodrigues, em sua dissertação de mestrado pela Universidade de Brasília em 2014, traz em discussão a aliança terapêutica na psicoterapia breve online. Como outros autores já citados acima, ela reforça que o atendimento online acessa públicos que teriam limitações para tratamento presencial por vários motivos, e a demanda pela psicoterapia online só aumenta e não pode ser ignorada, apesar da resistência que psicólogos possam ter aos avanços tecnológicos de forma geral. Foi constatado também junto ao Conselho Federal de Psicologia o aumento da procura por psicólogos para credenciamento de sites para poder atender. A autora destaca alguns possíveis motivadores de pacientes para procura de atendimentos psicológicos pela internet: limitação de mobilidade, falta de acesso ao psicólogo na localidade do paciente, economia de tempo e dinheiro e maior liberdade para se abrir com o terapeuta.

No que se refere a tecnologia, seus estudos sugerem que a comunicação entre terapeuta e paciente seja a mais segura possível para evitar riscos de evasão de informações. Algumas medidas seriam: ter computador próprio que só o terapeuta acessa, senhas, armazenamento seguro de dados, assinatura de um termo de compromisso e esclarecimento, mas reforça que isso tudo deve ser colaborativo entre as duas partes.

Ela faz algumas considerações sobre o ambiente de atendimento, que deve ser bem iluminado para ambas as partes terem boa visibilidade durante a videoconferência, o ambiente deve ser reservado e livre de interrupções, preservando-se assim, pelo menos em parte, o conceito de setting.

O objetivo geral de sua pesquisa foi o de verificar se há aliança terapêutica em atendimentos psicológicos mediados por computador. Sua amostra foi composta por cinco mulheres de idades entre 19 e 59 anos, que tinham alguma experiência no uso da internet. Foram realizadas no máximo 16 sessões individuais por videoconferência (SKYPE) seguindo o modelo teórico da psicoterapia breve focal. O estudo foi qualitativo, mas em alguns momentos foram utilizados instrumentos como WAI (Inventário de Aliança Terapêutica) e SEQ (Questionário de Avaliação de Sessão). 

Destacou-se algumas percepções importantes das participantes sobre a psicoterapia online: praticidade e conforto do lar ao serem atendidas; flexibilidade geográfica (mesmo estando em viagem, era possível fazer a terapia); economia de tempo e menos custo do que as terapias presenciais (mesmo não sendo cobrados honorários por ser pesquisa, o custo foi um aspecto a ser levantado); favorece a privacidade de pessoas mais tímidas que se incomodariam em ir a um consultório; a familiaridade com o consultório virtual veio rapidamente e se sentiam à vontade; ausência de contato físico pode ser um problema; a distância ajuda na expressão de certos temas e sentimentos; computador e conexão de internet tem que ser bons; ter um tempo limitado foi frustrante para algumas delas (queriam mais tempo), e, os resultados, de modo geral, foram considerados positivos.

Agora algumas percepções da terapeuta/pesquisadora: ela traz preocupações acerca da privacidade das pacientes em seu ambiente (tentava garantir que estariam sozinhas, sem interrupções, mas nem sempre isso foi possível); uma certa casualidade presente, pois era o ambiente das pacientes em que elas se sentiam à vontade, compartilhando também elementos bem particulares e íntimos (uma paciente mostrou seu bichinho de estimação à terapeuta); algumas cautelas devem ser tomadas para tratamento de casos mais graves, como pacientes com potencial suicida.

Em suas conclusões a pesquisadora afirma que a formação de aliança terapêutica enfrenta os mesmos desafios e possibilidades do atendimento presencial e que foi estabelecida com as participantes; os sentimentos e reações da terapeuta seriam semelhantes na psicoterapia presencial. A psicoterapia online tem um caráter prático e cômodo e os resultados desta pesquisa são compatíveis com os do exterior, principalmente nos Estados Unidos, em que esta prática já é estudada e realizada há algum tempo.

Ainda em 2014, mais uma publicação de Pieta e Gomes na Revista Psicologia: Ciência e Profissão, traz uma revisão de estudos empíricos de psicoterapia pela internet. Os autores trazem algumas considerações novas em relação às publicações anteriores. Baseados em análise das práticas desta modalidade fora do Brasil (principalmente na Austrália, Estados Unidos e Reino Unido), trazem uma diferenciação em psicoterapia online e intervenções via internet. A psicoterapia online é o atendimento por psicólogo através de internet, podendo se ampliar para o presencial. As intervenções online podem ter a participação ou não de psicólogos; são compostas por programas computadorizados de terapia em que se usam CDs, DVDs, realidade virtual, aplicativos de celular. Esta prática tem apresentado bons resultados de tratamento no exterior e a psicoterapia online também. Tratamentos para algumas psicopatologias tem tido sucesso, como depressão, ansiedade, fobias, pânico, transtorno de estresse pós-traumático e transtornos alimentares, e estudos mostram um futuro promissor para tratar adições e jogo patológico.

Os autores mostram também que a abordagem teórica da Psicologia que tem se mostrado mais eficaz no tratamento online de psicopatologias é a Terapia Cognitivo-Comportamental.

O atendimento online se mostra bastante promissor no campo da saúde mental e Pieta e Gomes (2014) afirmam que “as intervenções baseadas na internet deslocam o foco da doença mental para o comportamento de buscar ajuda. O indivíduo passa a ser agente de sua própria mudança…” 

RESULTADOS, DISCUSSÃO E CONCLUSÃO 

Para iniciar as considerações finais deste trabalho faz-se necessário considerar o princípio V (quinto) do Código de Ética Profissional do Psicólogo: 

“O psicólogo contribuirá para promover a universalização do acesso da população às informações, ao conhecimento da ciência psicológica, aos serviços e aos padrões éticos da profissão. ” Populações e potenciais pacientes que estão em localidades desfavoráveis ao encontro de um serviço psicológico em sua cultura (como residir em outro país e cidades muito pequenas), que tem mobilidade reduzida, dificuldades com os altos custos dos serviços presenciais (e de saúde em geral), pessoas com limitações psicológicas que as impedem de buscar um profissional presencialmente (casos de Ansiedade Social e Pânico, por exemplo) e que preferem a segurança e conforto de seus lares… Tudo isso remete-se ao “acesso” citado acima, que grande parte desta demanda, o atendimento psicológico atende.

Neste trabalho foram trazidos alguns dados fundamentais que chamam a atenção dos profissionais psicólogos por ser de seu interesse e prática genuínos, o auxílio às pessoas no que se refere à redução de sofrimento psicológico. A quantidade de trabalhos publicados eletronicamente não acompanha o crescimento e avanço das tecnologias digitais e demanda da população geral por serviços mediados por computador. De 2000 a 2014, foram encontrados apenas doze trabalhos. 

É claro que como em toda atuação profissional, cabe lembrar e ter muito cuidado com a ética e prática, sendo a modalidade online contraindicada em alguns tipos de casos.

Acredito que profissionais da Psicologia tem que desmistificar a internet de uma vez por todas e estarem onde se encontram pessoas em sofrimento, que afinal, é para isso que se exerce esta profissão. 

A internet preenche nossas vidas como uma nova forma de se relacionar, aprender, formar vínculos, e por que não de se tratar de um transtorno mental? Há indícios fortes de que a psicoterapia online (ainda não permitida no Brasil) é viável e tão eficaz quanto intervenções psicológicas presenciais, já praticada (e consagrada pelos seus bons resultados) há tempos nos Estados Unidos, Austrália e Reino Unido. Cabendo aqui complementar que a abordagem que mais se mostrou eficaz nesta modalidade de tratamento foi a Terapia Cognitivo-Comportamental.

Como conclusão, sugere-se que a pesquisa no Brasil deve acontecer no sentido de se conhecer e evoluir a prática online de intervenções psicológicas, no sentido de se integrar com a atuação presencial, e não ser uma modalidade apenas. Quando se há um terapeuta e um paciente, estejam eles onde estiverem, há uma relação terapêutica e um vínculo colaborativo pode ser firmado com resultados excelentes. Pesquisas sobre a abordagem Cognitivo-Comportamental e atendimento online devem ser ampliadas também e sobre psicoterapia online, com certeza.

O modelo de setting terapêutico tradicional já foi rompido e expandido, cabe a nós profissionais, cuidarmos desta expansão, para conseguirmos exercer a nossa tão nobre missão: ajudar o maior número de pessoas possível a ser mais feliz.

REFERÊNCIAS 

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